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Em anos ímpares acontece a Bienal do Mercosul em Porto Alegre, evento que vem chamando a atenção da comunidade artística nacional e internacional para a produção realizada pelos países desse bloco econômico. É certo que, a cada edição, o evento vem passando por um processo de alargamento de fronteiras, abrindo espaço para artistas dos quatro cantos do mundo. A sexta edição, com abertura marcada para setembro próximo, conta inclusive com um curador “gringo”, dando a impressão que de “Mercosul” essa mega exposição só conserva o título. Certamente devem existir motivos sólidos (provavelmente de ordem diplomática e, conseqüentemente, financeira) para se manter o nome original da mostra em sua atual configuração, algo que sustente a idéia de uma bienal de artes visuais de um bloco econômico. Alguém já ouviu falar da Bienal da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), por exemplo?
Não vejo nenhum problema na escolha de um curador estrangeiro para coordenar essa “empreitada” e tampouco sinto falta de uma “delegação gaúcha”, como muitos gostariam. O que se espera de uma curadoria é que ela tenha uma certa coerência e isso não tem nada a ver com territorialidade. No entanto, não deixo de achar estranho o pouco interesse que a curadoria dispensou para a produção local, em especial para a dita “emergente”, entre a qual tenho boa mobilidade. Não conheço artista que tenha tido o seu atelier ou escritório, como está se chamando o espaço de criação artística atualmente, visitado ou contatado. Acho no mínimo curioso, afinal curadores adoram “descobrir” novos artistas e Porto Alegre está cheia de bons deles.
A não inclusão de gaúchos no certame gerou um visível desconforto para a Fundação Bienal do Mercosul, que rapidamente lançou o programa “Diálogos”: artistas locais podem se inscrever para uma conversa com curadores e artistas nacionais e internacionais. Estratégia eficaz e diplomática, bem ao gosto institucional.
Outras reações surgiram e, saudavelmente, vieram dos artistas. Estão programadas para o mesmo período da bienal duas grandes mostras coletivas que pretendem dar visibilidade para realizadores ainda não totalmente inseridos no meio artístico em um período em que o público está disposto a apreciar arte. A atitude é louvável, mas confesso que tenho algumas dúvidas quanto a sua praticidade, principalmente no que diz respeito às duas motivações citadas acima: inserção do artista e pré-disposição do público.
A fim de ser mais objetivo, formulei duas perguntas:
Será que é interessante para um artista participar de uma grande exposição coletiva (uma delas terá mais de 300 participantes), onde assumidamente irão figurar trabalhos “imaturos”, como defende uma das paralelas, não arbitrando dessa forma o contexto em que seu trabalho será exibido e correndo, então, o risco de ter sua potencialidade diminuída por uma “má vizinhança”?
Será que o desinteressado público, que fatalmente parece se comportar mais como um visitante da Expointer do que como alguém disposto a ver e refletir sobre algo, terá disposição para acompanhar mais um (no caso dois) grandes eventos, tendo a organizada e legitimada Bienal do Mercosul como uma grande exposição coletiva disponível?
De forma alguma é minha intenção como artista e público desmerecer o valor desses projetos paralelos que, inevitavelmente, acabam relativizando determinadas certezas no restrito meio local. O que me incomoda é que parece ser necessária a presença da grande mostra para que os artistas juntem suas forças para a elaboração de novas formas de exibição, fazendo essas iniciativas soarem como oposições e não como alternativas de se fazer e mostrar arte.
Talvez minhas perguntas não tenham respostas, talvez elas nem tenham pertinência frente ao possível caráter dos eventos, mas tenho uma última pergunta que também pode ser encarada como uma sugestão: poderiam essas propostas, conservando os mesmos princípios, acontecerem em anos pares, fugindo assim da concorrência natural com a Bienal do Mercosul e pleiteando, inclusive, o patrocínio da mesma?
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