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Uma das grandes lacunas no ensino acadêmico é uma disciplina que contemple os diversos mecanismos da formação e articulação profissional do artista contemporâneo. A começar por uma reflexão sobre o significado do curso universitário enquanto formação profissional e suas possibilidades de interatividade, bem mais amplas do que aparentes, e passando para a construção deste artista enquanto profissional articulado com o Sistema da Arte.
São poucos os docentes que tocam no assunto e poucas as reflexões diante das profundas modificações que estão ocorrendo em face da revolução tecnológica que vivemos.
Ao optar-se pelo curso de Artes Visuais pressupõe-se que houve um reconhecimento de que só ter talento pessoal pode ser insuficiente para um exercício profissional da Arte. Ao ingressar num curso universitário de Arte, o aluno deve assumir sua responsabilidade de opção, colocando-se aberto e ávido diante dos conhecimentos que será conduzido a buscar. Não se tratam de informações gerais como numa escola, onde não existe opção pelos conteúdos. Achar que a realização dos exercícios acadêmicos serve apenas para alcançar uma média e agradar o professor é desperdiçar esforços de todas as partes, e o que é pior, é um atraso na formação profissional. Todos os conteúdos explorados durante o curso podem ser úteis na formação profissional do artista acadêmico e isto deve ser levado em consideração desde o primeiro semestre. O olhar introspectivo, a investigação de questões artísticas pessoais, a possibilidade de parcerias para a construção de sua fundamentação teórica e enriquecimento de sua plástica, são recursos oferecidos desde os primeiros instantes, mas caberá somente à postura pessoal de cada um assimilar e articular todas estas possibilidades interativas.
Outra questão importante, neste foco de formação profissional, é perceber a forma como a tecnologia e a comunicação são fundamentais não apenas como um meio ou suporte para a Arte, mas como ferramenta diferencial na condição profissional do artista de carreira.
Já na Universidade percebe-se o largo uso da tecnologia para a (in)formação do artista. Deste estudante de Arte será exigido uma apresentação de suas idéias e resultados didáticos através de meios digitais, redação em word, talvez excel, photoshop, corel, uso de editoração de fotografias que muitas vezes serão digitais, construção de power point para apresentações, comunicação com colegas e professores a partir da internet, e-mails, grupos, messenger, blogs, sites...
Na continuidade de seu processo de formação artístico-profissional, o artista deverá não só saber articular sua comunicação pela internet, como isto será condicional ao seu reconhecimento junto ao Sistema da Arte que passa a se articular através da informática. Será necessário criar e manter seu próprio portifólio eletrônico, com boas fotos virtuais, blog ou site, onde pode-se acessar um maior número de informações sobre este artista, diferenciando-o profundamente dos artistas que são analfabetos digitais.
Afora sua formação acadêmica e articulação tecnológica, o artista profissional deverá contar com uma infra-estrutura social que o mantenha informado e interagindo na comunidade artística em que atua. Deve ser visto e lembrado, deve participar e criar com a comunidade artística de seu entorno, para que sua produção tenha visibilidade. Não é à toa a existência de uma tendência relativa aos coletivos de arte, que não são apenas mais uma característica para designar grupos criativos, mas uma forma de conseguir alcançar e legitimar resultados profissionais. Basta olhar para a história da arte para reconhecer que participar de e interagir junto a grupos artísticos foi fundamental para o aparecimento de muitos novos talentos.
Observa-se, assim, que existem vários aspectos além da técnica e da sensibilidade que irão fazer parte deste Artista Profissional e que são condicionantes de seu reconhecimento no Sistema da Arte atual. Haveria muitas questões a serem elaboradas e exercitadas, buscando-se uma excelência na profissionalização do artista, tornando-o mais preparado para interagir no Sistema de Arte nacional e internacional. Por outro lado, articulando-se no sentido mais clássico, mas ao mesmo tempo problemático e com pouco consumo, quase que por um golpe de sorte, artistas que se negam à articulação social ou tecnológica também conseguem seu reconhecimento baseados numa qualidade extraordinária de seus trabalhos, mas isso é exceção, qualidade cada vez mais rara, tanto quanto o reconhecimento de artistas que negam fundamentação teórica em detrimento exclusivo da produção prática. O mais provável é que, diante das circunstâncias da Arte atual, haverá cada vez mais excelentes artistas profissionalizados, diferenciados por uma boa articulação profissional, que, com certeza fará diferença na hora da seleção, da premiação, do reconhecimento do sistema, num processo natural de escolha pelo melhor preparado, e o artista que tem dificuldades com sua profissionalização acabará ficando pra trás.
É claro, também, que a construção da informação pessoal sobre esta profissionalização, tanto quanto a construção de uma linguagem plástica própria, obedecem escolhas por parte do artista que deverão ser harmonizadas com sua própria personalidade, afinadas com sua produção e mais uma vez mostra-se a necessidade da elaboração de fundamentos deste conhecimento que possam ser apresentados ao artista em formação com todas as suas possibilidades. Logo, isso não poderia ser tratado de forma tão superficial quanto este artigo, mas, sim, necessitaria da formulação de uma metodologia de ensino específica, abrangente e interativa.
Se o que se escreveu até aqui parece superficial diante de tantas possibilidades de aprofundar o assunto, o que dizer da pouca abordagem que esses assuntos têm nos currículos acadêmicos. Ao invés de gastarmos um semestre inteiro com uma disciplina que poderia ser assimilada com a leitura de dois, três livros sobre o assunto, por que não incluir uma disciplina que falasse especificamente sobre a formação e articulação profissional do artista? Isto sim seria um assunto fundamental para a manutenção de um Sistema de Arte local saudável e dinâmico.
Concluindo, assim como o artista aluno deve ter um papel responsável com relação à forma como assimila os conteúdos de sua formação profissional, acho que cabe, também, à universidade assumir uma postura de ensino responsável, reformulando suas prioridades didáticas e fazendo uma avaliação de seu papel enquanto atuante no fomento profissional, pois, de outra maneira, acabará por formar artistas pela metade, com pouca articulação profissional, que não criam oportunidades e que só contribuem para um Sistema de Arte estagnado em si mesmo, pouco producente e dependente das políticas culturais pré-estabelecidas.
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